Hora de voltar?
Depois de tanto tempo decidi voltar. O por quê? Um forte impulso.
Estava no carro, dirigindo, com esse sol que tem assolado São Paulo nesses últimos, mas já estava no entardecer, e resolvi fazer um antigo caminho. Um caminho que não fazia há anos.
Memórias e sensações perdidas começaram a aparecer, e com isso, um fluxo de pensamentos começou. Acredito que seria o que os escritores chamam de "Brain Storm".
Não sou escritor e nem acho que escrevo muito bem, mas mesmo assim resolvi escrever baseado nesse suposto "Brain Storm"; inclusive a vontade de escrever surgiu com ele, porque vieram com os pensamento e queria evitar perdê-los.
Quanta coisa mudou, mas não tanto o que estava fora do carro, mas sim o que estava dentro do carro, entre o volante e o assento. Lá fora estava quase tudo do mesmo jeito que há anos; a maior mudança foi comigo.
Só um comentário quanto ao texto: Talvez não faça muito sentido do jeito que colocarei as coisas e provavelmente haverá erros de escrita, mas essa não é minha preocupação. Colocarei em ordem assim que puder.
As perdas, as vindas, os retornos... tudo começou à vir com a visão daqueles lugares.
Passava lá quase todo dia com meu pai; ele me levava à escola. Ele fazia cachorro-quente e leite com achocolatado para mim no café da manhã e hoje penso: "Que pai exemplar!"; mas, apesar da ironia, não sei se devo recriminá-lo muito, afinal, ele só queria agradar o filho, mas depois comecei a pensar se essa situação e talvez eu deveria recriminá-lo ,sim, por ter me mimado e por ter acabado desse jeito. Mas não posso culpá-lo ou inocentá-lo, ao menos exclusivamente, porque tantos são os outros culpados. Será que Freud ou Jung explicariam os meus casos?
Talvez não deva recriminá-lo mesmo, já que vivi pequena parte da minha vida "consciente" com ele: apenas 8 anos de idade cronológica e não sei quanto de idade psicológica; se bem que dizem que nessa idade é que tudo fica. "O menino é o pai do homem".
Tento me lembrar do que pensava antigamente ao passar naquele lugar... Me lembrei da música! Ah sim! A música! Isso sim é meu verdadeiro vício. Sempre foi! Me lembro que ele escutava CBN e eu odiava, queria morrer devido àquilo (mais tarde não só por isso), mas depois ele começou a colocar na Jovem Pan FM, e devo dizer, naquela época, para mim aquilo ''e que era música! Lembro, principalmente, da música do "Four Non Blondes"! "And I say: What's going on"!!! Eu nem sabia o que eles falavam, mas eu simplesmente adorava! Aquilo mexia comigo em todos os níveis: psicológico, hormonal, espiritual e sexual! Era demais! Aquelas ondas de rádio eram o mundo! O fator música, que mudou MUITO, tenho que ressaltar, tenho que agradecê-lo! Foi ele quem deu o pontapé inicial; muito antes de eu conhecer Pink Floyd.
Mas ele teve que perder a vida em um acidente de carro. "De carro!", eu exclamo.
Ele sabia que desde pequeno essa era minha paixão. Eu e os carros. A sensação de velocidade, o medo de andar na pista expressa da Marginal Tietê indo à Portuguesa, as cantadas de pneu saindo de casa e o melhor de tudo: poder ligar o carro! Comparando com hoje, posso dizer que a sensação era melhor que a de um orgasmo! Aquilo era tudo para mim, dentro do meu mundo. "Tudo o que ele precisava era de uma roda na mão e quatro no chão". Mas ele se foi, graças a um carro, talvez alguns ml de álcool no sangue e um traumatismo craniano no lado direito... "Dentro de um carro". Mas isso eu confesso de peito aberto: nunca precisou ser superado, pois nunca me afetou. Sempre sonhei quando chegaria o meu dia de dirigir; o dia em que eu estaria no volante, acelerando e com a suave brisa me acariciando, falando belas histórias, apresentando soluções aos meus problemas... tudo em tom de voz baixo e doce... O vento... que sensação!
Mas por que ele se foi?Por que ele se foi!??!?! Não é justo! Eu só chorei algumas vezes por esse fato: quando me contaram que ele havia falecido, depois daqueles dias em que os três restantes se divertiram tanto em casa e antes da viagem que tanto aguardáramos; quando o vi no caixão selado, "dormindo"; e quando contei àquela falsa, manipuladora, cínica, louca e perseguidora que eu queria saber o que ele acharia de mim se estivesse vivo: se teria orgulho ou desprezo por mim.
Me lembro até que bem daquele estranho dia do fato... A pessoa que me contou a notícia e o rancor que guardo por ela e lembro que meu padrinho me levou para casa. Chegando lá, no Jardim, ele me comprou um "Kinder Ovo®" e derrepente me senti aliviado, talvez até feliz. Hoje, pensando nesse fato isolado, me sinto um monstro (no final das contas, por esses e outros casos). Um garoto, que acabara de perder o pai fica feliz ao ganhar um "Kinder Ovo®"!!!. É possível incriminar alguém por isso, ou podemos desculpar devido à idade? Será que é só uma coisa pequena ou estou me punindo severamente? Esse tipo de questionamento flui em minha mente constantemente, não só por esse caso, mas por quase tudo, como poderei escrever mais à frente. Mas afinal, quem é o juiz? Eu? Você? A sociedade? A ciência? Eu não sei!!! Mas quem terá a razão?!
Também me lembro que pouco depois do chocolate, ligaram para minha casa procurando por meu pai. Não soube responder. Talvez até hoje eu não saberia responder àquele telefonema. Foi um momento estranho... Momentos estranhos... àqueles de 12 anos atrás, os de hoje de tarde e os de agora.
Há quem diga que é coisa de "Libriano", ser indeciso e ter esses questionamentos; há quem diga que é de gente fraca, que não se acerta e não se esquece do passado, o popular traumatizado; mas eu não sei. Só sei que nos últimos tempos eu tenho tentado me acertar com ele (o passado), resgatando e corrigindo erros. Nem todos são passíveis de correção, mas me esforço para com aqueles erros que acredito que devo me esforçar. Ah! Também há quem diga que é coisa que surge com a proximidade do aniversário. Antigamente ficava com a última opção, mas hoje, uma coisa tenho certeza: não é só isso que me causa esses "fluxos".
O carro, o sol, o vento, as ruas, as casas, o hospital, a escola, eu... eu... eu... ..................... O que sou eu?
"People are crazy and times are strange
I'm locked in tight, I'm out of range
I used to care, but things have changed"
Por onde ando?